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Blog O Comentário da Semana por José Pedro Calheiros

1 Julho 2010
O funeral a que o Senhor Silva faltou

Não sou de esquerda, nem de direita. Nem do centro, nem das pontas, nem assim-assim. Está feita a nota prévia. Mas tenho as minhas opções de gestão dos povos, das culturas, das civilizações e obviamente do meu país. E como tenho muito tempo livre para pensar, gosto de maturar bem as coisas e observar os diferentes pontos de vista. A morte de José Saramago era inevitável. Bem, a minha também parecer ser e eventualmente a sua também. Assim como a do Senhor Silva, que hoje ocupa o cargo de Presidente de Portugal, corrijo, de presidente da república de Portugal, o que poderá não significar exactamente a mesma coisa. Mas o Senhor Silva não gostava de José Saramago, o que é comum a muitas pessoas. Eu próprio não nutria grande simpatia pelo senhor. Não concordava com muitas das suas afirmações, que eventualmente correspondiam às suas ideias, nem com aquele estilo de "prima donna" do pensamento, que efectivamente era. A sua obra é magnífica. Absolutamente magnífica.

José Saramago aumentou de três para quatro os escritores maiores de Portugal, com Camões, Bocage e Pessoa. Rio-me baixinho, quando alguém refere que a obra de Saramago é difícil, que ele tinha problemas de pontuação e parágrafos. Rio-me baixinho, porque não é polido rirmo-nos da falta de instrução de outrem. Quem assim comenta, nunca leu Saramago, embora possa ter comprado e guardado alguns dos seus livros, o que, de novo, não é a mesma coisa. Quem assim comenta, além de não ter lido Saramago, também não lê muita coisa além das revistas de televisão e jornais desportivos. Mas voltemos ao funeral. O tal Senhor Silva, homem do povo como o falecido, que se aplicou nos estudos e tornou-se num economista que sabe muito (ele diz que sabe muito), ocupa um cargo que é uma figura de estado, que representa todos os portugueses, mesmo os que não gostam dele ou da figura de estado que representa, custa muito dinheiro a todos nós e por isso tinha de estar no funeral de uma das maiores figuras da arte literária portuguesa. Mesmo que o Senhor Silva odiasse a presença, o presidente tinha de estar. O falecido iria odiar a presença do Senhor Silva, mas ia admirar a presença do seu Presidente Republicano. Há momentos na História dos povos e das civilizações que marcam a sua existência. A obra de Saramago será, dentro dos próprios limites por ele visionados, perdurável. E a ausência do Senhor Silva ?


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